Aparecida

Escalonamento intermitente em Aparecida vai pressionar sistema de Saúde de Goiânia

Da Redação

A liberação das atividades não essenciais em plena pandemia, como decretada pelo prefeito de Aparecida Gustavo Mendanha a partir desta segunda, 15, substituindo medidas mais duras como o lockdown que foi prorrogado em Goiânia por mais 14 dias, não é consenso entre a comunidade científica.

A ideia do escalonamento intermitente por regiões foi proposta originalmente pela escola de Saúde Pública da prestigiosa Universidade de Harvard, nos Estados Unidos – mas não como foi adotado em Aparecida e sim em termos de grandes regiões de um país ou Estado, englobando dezenas de cidades ao mesmo tempo

Pelo decreto do prefeito Gustavo Mendanha, bairros e macrozonas de Aparecida poderão voltar a reabrir o comércio e os serviços, alternando com o fechamento em outras regiões urbanas. Isso provavelmente diminuiria a incidência de casos de Covid-19 no município, mas não em número suficiente para reduzir ou superar o colapso do sistema hospitalar público e privado aparecidense – já com leitos de UTIs esgotados e com disputa entre os pacientes por uma vaga de enfermaria.

Isso é ainda mais evidente quando Aparecida e Goiânia são municípios conurbados, isto é, com pontos de contato estreito entre as suas populações. Com isso, a prorrogação do lockdown baixada pelo prefeito da capital Rogério Cruz acaba sendo minimizada, não produzindo os efeitos desejados quanto à redução da propagação do novo coronavírus e sem aliviar a estrutura goianiense de atendimento médico, que vai passar a ser pressionada pelos doentes oriundos de Aparecida.

Segundo Gustavo Mendanha, o escalonamento intermitente teve aprovação de 98% da população quando foi implantado pela primeira vez em Aparecida, entre junho e agosto de 2020. Esse percentual, no entanto, se assemelha mais a um chute, já que não foi apresentada nenhuma pesquisa ou estudo de campo comprovando esse alto nível de respaldo entre os moradores da cidade.

Há suspeitas de que o modelo decorre mais da necessidade da prefeitura aparecidense de fugir dos desgastes que medidas de restrição mais duras sempre acarretam. Tanto que Mendanha só teve reuniões com empresários locais antes de anunciar a sua decisão, não existindo notícias de que ouviu médicos, especialistas ou professores universitários comprometidos com o estudo dos impactos da pandemia em Goiás.

Tiveram papel preponderante na decisão do prefeito de não acompanhar a prorrogação do lockdown por mais 14 dias em Goiás as pressões do presidente da Federação das Indústrias do Estado de Goiás – FIEG Sandro Mabel, que intensificou nos últimos dias seus ataques ao governador Ronaldo Caiado diante da necessidade de endurecer o enfrentamento à pandemia. No Estado, Mabel lidera a corrente negacionista e se alinha com o presidente Jair Bolsonaro na condenação a qualquer suspensão das atividades econômicas para diminuir a propagação da Covid-19.

Sandro Mabel, acusado de ser negacionista, tem influência sobre Gustavo Mendanha e foi o indutor do relaxamento do lockdown em Aparecida

Nenhuma grande cidade implantou modelo implantado por Mendanha

No ano passado, entre junho e agosto, quando a aceleração de casos da Covid-19 se expandia por todo o país, o prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD) cogitou a adoção do isolamento intermitente e chegou a enviar representantes à Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, para conhecer a proposta.

Ato contínuo, desistiu da ideia. Belo Horizonte foi e ainda é uma das grandes cidades brasileiras que mais endureceu as medidas de restrição ao comércio e aos serviços, que, no momento, encontram-se fechados com raríssimas exceções quando a permissão para portas abertas. “Vamos trancar a cidade por quanto tempo for necessário”, avisou Kalil.

Hoje, além de Aparecida, não há notícias de outra cidade brasileira de porte que tenha adotado o modelo de escalonamento intermitente para o funcionamento das atividades econômicas não essenciais como estratégia de combate à pandemia. Ainda mais quando há uma outra grande concentração urbana nas vizinhanças, caso de Goiânia – o que torna injustificável que haja divergência entre os seus prefeitos em relação ao enfrentamento preventivo à nova doença, fazendo com que a falta de comprometimento de um, Gustavo Mendanha, venha a atrapalhar os esforços de outro, Rogério Cruz.

Os estudos da universidade de Harvard sobre o escalonamento intermitente foram calibrados para um período de 2 a 5 anos, prazo que pandemia poderá gastar para desaparecer, a depender das medidas de prevenção, da vacinação, da duração da imunização trazida pela vacina, exigindo, como no caso da gripe comum, campanhas periódicas de vacinação e, sempre, em grandes e não pequenas regiões, como, por exemplo, no ano passado na Coreia do Sul, que foi vitoriosa com a utilização do modelo. Enquanto isso, o lockdown é a melhor solução.

Com 600 mil habitantes, a reabertura parcial das atividades econômicas não essenciais em Aparecida significa, na prática, que duas ou três regiões, com densidade demográfica maior do que Rio Verde ou Catalão estarão sempre criando condições para o contato entre as pessoas e a propagação do vírus.

Exemplo dentro de casa

O prefeito de Aparecida Gustavo Mendanha conhece, por experiência própria, a ferocidade do novo coronavírus. Grande parte dos seus familiares, inclusive dois dos seus quatro filhos, foram contaminados pela doença, no período em que não havia nenhuma medida de prevenção sanitária vigorando na cidade, com a 2ª onda da pandemia correndo solta. A mãe de Mendanha e seis tios também contraíram a doença, igualmente na época em que a cidade funcionava sem restrições em todos os seus setores. Seu pai teve 25% dos pulmões comprometidos, mas testou negativo.

Print das redes sociais mostra Gustavo Mendanha, sua esposa Mayara e seus quatro filhos, dois dos quais foram contaminados

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