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Machismo e desinteresse dos partidos inviabilizam mais mulheres nas eleições

A falta de apoio dos partidos políticos é o principal motivo para mulheres não se candidatarem a cargos políticos, conforme constatação de uma pesquisa encomendada pela Procuradoria da Mulher no Senado e divulgada pelo DataSenado. Os dados revelam que 41% das entrevistadas deram essa justificativa para a pouca participação feminina no processo eleitoral. De acordo com o resultado, 25% das pesquisadas apontaram a falta de interesse por política, 19% indicaram a dificuldade de concorrer com homens, 7% reclamaram da falta de apoio familiar e 5% preferem dedicar o tempo às tarefas domésticas.
“A grande barreira para a participação das mulheres é a própria estrutura partidária. Os partidos não garantem condições para as mulheres concorrerem em pé de igualdade com os homens”, destacou o assessor especial da Secretaria de Transparência do Senado, Thiago Cortez. A consulta revelou ainda que, para 83% dos pesquisados, o candidato ser homem ou mulher não faz qualquer diferença na hora de votar. O mesmo levantamento sinalizou que 79% disseram já ter votado em alguma mulher para ocupar cargo político, 20% nunca votaram e 1% não sabe ou não respondeu.
“O eleitorado está disposto a votar em mais mulheres e não considera o sexo do candidato na hora de optar pelo voto. Muito pelo contrário. Alguns indícios indicam que, quando há predileção, é justamente por mulheres”, acrescentou Cortez. O pesquisador reconheceu que, apesar da Lei Eleitoral destinar 30% das vagas às mulheres, o fato de não haver sanção para as legendas que descumprem a norma é um grande problema. Segundo ele, propostas políticas prevendo igualdade entre os sexos tem apoio da maioria dos entrevistados.
De acordo com o DataSenado, o fato de os brasileiros já terem eleito uma mulher para a Presidência da República fortaleceu a participação feminina na política nacional. Para 65% dos eleitores ouvidos, a eleição de uma presidenta influencia o eleitorado a escolher mais mulheres. O interesse das mulheres é grande. A pesquisa constatou que 62% se candidatariam se acreditassem em alguma chance de vitória. Na eleição de 2018, das 7.139 candidaturas à Câmara dos Deputados, apenas 2.272 foram de mulheres, contra 4.867 de homens. Comparada à masculina, a participação feminina cresceu 11% nos últimos 15 anos.
Em 1998, nas eleições para deputado federal, o número de mulheres na disputa era de 10%. No pleito de 2010, atingiu 19%. Hoje, alcança 31%. Mesmo sendo maioria da população brasileira (52,5%), as mulheres ainda enfrentam dificuldades para assumir cargos eletivos em todo o País. Em 2020, elas somaram 33,3% de candidaturas para prefeita, vice-prefeita ou vereadora, e foram apenas 16% de todos os eleitos.
Atualmente, a Justiça Eleitoral obriga que 30% das candidaturas de coligações sejam femininas. A norma é colocada como condição para que os partidos tenham acesso ao Fundo Eleitoral. No entanto, passadas as eleições municipais, começam a surgir, pelo País, denúncias de candidaturas “laranja” de mulheres – ou seja, candidatas teriam se registrado apenas para cumprir a cota de cada partido.
Para o especialista em direito eleitoral Acácio Miranda, é muito comum que os partidos forjem candidaturas de mulheres para terem acesso ao fundo, principalmente no interior do País. Além disso, a regra que obriga o repasse de 30% dos valores para as postulantes femininas acaba abrindo margem para a prática do crime de caixa 2.
“Em muitos casos, essas candidaturas laranjas recebem o dinheiro do fundo e acabam passando para os outros candidatos. Elas entram apenas para cumprir a cota, mas, na verdade, não estão na disputa. Nessas situações, o Código Penal prevê até cinco anos de prisão, tanto para a candidata quanto para quem se beneficiou”, explicou Miranda.
Segundo ele, a Justiça Eleitoral tenta garantir uma equivalência na participação entre homens e mulheres nas disputas eleitorais, mas as fiscalizações são falhas. “Hoje, a fiscalização é feita por meio da prestação de contas, mas é preciso que haja uma apuração mais efetiva, de rua, de campanha. É necessário acompanhar se esses materiais de campanhas que são impressos e distribuídos são realmente dessas candidatas”, frisou.

Cida Alves: “Fere a democracia utilizar mulheres como laranja”

A totalidade dos 36 partidos não conseguiu preencher suas chapas para a Câmara Federal e à Assembleia Legislativa nas eleições de 2018 em Goiás e para a Câmara Municipal em 2020 nos 246 municípios goianos. Muitos deles utilizaram-se de “candidatas-laranja” para preencher a cota feminina de 30%.
Para 2022, os dirigentes percorrem os 246 municípios goianos em busca de pré-candidatas a deputada federal e a deputada estadual, mas estão longe de alcançar o mínimo de 30% da cota feminina exigida pela legislação eleitoral. Grupos de feministas fizeram, em Goiânia, a entrega de um manifesto ao Tribunal Regional Eleitoral de Goiás (TRE-GO), no qual alegam que os partidos Avante, Cidadania, PL, PMB, PSB, PSC, PSL, PTB e PTC não cumprem a legislação na capital goiana. “Para nós, é incompatível com a democracia e a Justiça a utilização dos nomes de mulheres apenas para burlar o registro de vagas”, criticou Cida Alves, do Movimento Não é Não.
A lista de mulheres com nenhum ou apenas um voto predomina em candidaturas de pretas ou pardas (59%), enquanto brancas representam 39% e indígenas, 1%. Para Cida Alves, por mais que a Justiça Eleitoral assegure segurança nas eleições, é necessário que haja uma garantia da participação feminina de verdade nas disputas.
“A gente precisa de uma fiscalização mais aguçada, que garanta que a verba seja utilizada para financiar as campanhas femininas. Hoje, o que vemos em muitos partidos é o uso das mulheres para o preenchimento de cotas, e o dinheiro das campanhas sendo utilizado por homens. Com uma apuração mais eficiente, eu acredito que vamos mudar essa cultura de usar a mulher como laranja”, afirmou a ativista. (H.L.)

Líder do Movimento Não é Não, a psicóloga Cida Alves diz que a Justiça Eleitoral falha ao não garantir a participação das mulheres nas eleições

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